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segunda-feira, 23 de março de 2015

O Livro da Vida e Moisés - "Risque o meu nome do livro dos vivos"


Pela primeira vez, desde o início do Êxodo, o nome de Moisés está ausente por toda uma פָּרָשַׁת parashá (uma divisão completa, uma parte do texto bíblico).

Porque Deus teria deixado o nome de Moisés fora da parashá conhecida em hebraico como תצוה Tetzaveh?
Essa pergunta vem do fato que Moisés é deliberadamente e claramente omitido desta parte do livro do Êxodo. Por diversas vezes, a Torá cria situações onde o nome do grande líder dos Israelitas deveria aparecer - mas que no final, serve apenas para excluir o seu nome do texto.
Vemos já na primeira sentença desse trecho do livro do Êxodo, que ela não é iniciada da forma usual, "E o Senhor falou a Moisés, dizendo...". Ao invés disso, nós encontramos uma ordem abrupta e direta: "Tu pois ordenarás aos filhos de Israel..." Êxodo 27:20, sem citar o nome do grande Legislador de Israel.

Risca-me Peço-te, do Teu Livro

Há uma מדרש midrash (uma história simbólica), que faz uma fantástica conexão entre a omissão do nome de Moisés, em todo este trecho do livro do Êxodo, com o dramático encontro que houve entre o líder Israelita e Deus, porém que só aparece no texto bíblico bem mais adiante na história da redenção.
Depois dos filhos de Jacó terem cometido o gravíssimo pecado de adorar ao עגל הזהב egel hazahav, bezerro de Ouro, Moisés se volta para o povo e diz: "Vós cometestes grande pecado. Agora, porém, subirei ao Senhor; porventura farei propiciação por vosso pecado." Êxodo 32:30.
Moisés, então, sobe o monte Sinai onde ele confronta o seu Criador:
"Ora, este povo cometeu grande pecado fazendo para si deuses de ouro. Agora, pois, perdoa o seu pecado; se não, risca-me, peço-te, do teu livro, que tens escrito." Êxodo 32:31-32.
Ao que Deus o responde:
"Aquele que pecar contra mim, a este riscarei do meu livro." Êxodo 32:33
Estas declarações são muito intrigantes. Que livro seria este a que Deus e Moisés se referem? Muitos estudiosos acreditam que ambos se referiam ao Livro da Vida, que é citado no texto do livro do Apocalipse, "E aquele que não foi achado escrito no livro da vida foi lançado no lago de fogo." Apocalipse 20:15
Há, porém, uma tradição Talmúdica que afirma que Moisés se referia ao Livro do Julgamento, onde Deus determinava o destino (aqui com sentido de sentença), que seria dado à Sua Criação:
"Sejam riscados do livro dos vivos, e não sejam inscritos com os justos." Salmos 69:28

"Se o Senhor não perdoar os Israelitas, então, risque-me do livro celestial do julgamento, para que assim eu morra..." Talmud Bavli Rosh Hashana 16b
Ainda há aqueles que sugerem que quando Moisés pediu, "risca-me, peço-te, do teu livro", ele estaria falando da Torá (os cinco primeiros livros da Bíblia).
"Se o Senhor não perdoar aos Israelitas, então estou fora! Apague o meu nome de todo o texto da Torá! Eu não quero mais fazer parte deste plano da Redenção!" Midrash Rabba Shemot 47:9
A resposta divina deixa muito claro que Deus não tinha nenhuma intenção de "apagar Moisés do Seu livro". O problema que surge aqui, é que Deus não poderia simplesmente ignorar as palavras do grande líder Israelita.
Deus tinha entregado nas mãos de Moisés uma grande missão, e confirmava cada palavra dele com grande poder. Deus deu poder a Moisés, para ver as suas palavras sendo cumpridas, na medida em que este grande profeta falasse.
E para fazer cumprir as palavras que Moisés havia falado sobre si mesmo, o Senhor deliberadamente omite o nome de Moisés de todo esse trecho Bíblico.
Enquanto que essa abordagem da midrash é bastante poderosa, ela não é muito feliz em apontar uma questão fundamental: Porque, entre todos os trechos da Torá (as parashás), teria sido escolhida logo a parashá Tetzave, para omitir o nome de Moisés?


Moisés Pede que Deus Risque o seu Nome do Livro dos Vivos.

O Líder Não Sabe Tudo

Se olharmos mais de perto o dramático encontro ocorrido em Deus e Moisés, veremos surgir possibilidades fascinantes. Nos momentos críticos e turbulentos que seguiram o pecado do bezerro de ouro, Moisés aparentemente comete um erro fundamental na sua atuação como líder - um erro que foi imediatamente corrigido por Deus.
Este erro começa no momento em que Moisés se volta para o povo e diz:
"Vós cometestes grande pecado. Agora, porém, subirei ao Senhor; porventura farei propiciação por vosso pecado" Êxodo 32:30.
Subindo ao monte Sinai, Moisés confronta o seu Criador:
"Ora, este povo cometeu grande pecado fazendo para si deuses de ouro. Agora, pois, perdoa o seu pecado; se não, risca-me, peço-te, do teu livro, que tens escrito Êxodo 32:31-32
Em outras palavras, Moisés estava dizendo: "Se o Senhor não perdoar os Israelitas, use-me como expiação por eles. Puna-me ao invés deles!" A resposta divina é rápida e enfática:
"Aquele que pecar contra mim, a este riscarei do meu livro" Êxodo 32:33

- "Moisés, mesmo com tudo o que ocorreu, você ainda não entendeu. Não aceitarei substitutos quando se tratar de responsabilidade pessoal. Você não pode pagar pelos erros dos outros. Aqueles que pecarem devem ser responsabilizados diretamente".
Com esse entendimento, o dramático encontro de Moisés com Deus, que se seguiu após o חֵטְא הַעֵגֶּל chet ha'egel, o pecado do bezerro de ouro, reflete as lições aprendidas daquele evento.
Mesmo Moisés precisava ser lembrado que ele não poderia servir de intermediário entre Deus e o Seu povo.
Esta era uma tarefa divina, somente Deus pode interceder por nós, em relação a si mesmo, pois na cruz do calvário era Deus (o Filho), sendo castigado por Deus (o Pai), para que nós pudéssemos receber o perdão dos pecados.
É somente Deus quem pode interceder por nós para consigo mesmo, pois no calvário era Deus castigando Deus, era Deus se entendendo com Deus ao nosso respeito:
"Mas ele foi ferido por causa das nossas transgressões, e moído por causa das nossas iniqüidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados" Isaías 53:5

"E perto da hora nona exclamou Jesus em alta voz, dizendo: Eli, Eli, lamá sabactâni; isto é, Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?" Mateus 27:46
Agora nós podemos entender a conexão que há entre esta parashá (trecho Bíblico), e a omissão do nome de Moisés. A parashá Tetzave é dedicada exclusivamente ao tema da כהונה kehuná, o Sacerdócio.
E nos limites desta parashá, a Torá introduz o conceito de כהונה kehuná, trazendo os detalhes das vestimentas e da investidura de Arão e seus descendentes na sua tarefa como כהנים Kohanim, sacerdotes.
E como vimos anteriormente, a função de כֹּהֵן cohen, sacerdote, carrega o potencial perigo de que o sacerdote possa perceber a si mesmo como um intermediário entre Deus e o povo. Ao contrário, o sacerdote era apenas um representante da nação Israelita, dentro do Templo.
Para ilustrar que nenhum homem deve ter essa percepção de si mesmo como um intermediário entre o Criador e o povo, o Senhor omite o nome de Moisés de todo esse trecho Bíblico específico.

Riscarei do Meu Livro Aquele que Pecar Contra Mim.

Cuidado com o que Pedimos

Alguns estudiosos oferecem outra explicação para a ausência do nome de Moisés, nesta parashá. Baseados em uma tradição Talmúdica que tem suas raízes ligadas ao episódio da sarça ardente, quando Deus chama Moisés para a sua missão de liderança do povo de Israel.
Naquele momento, Deus tenta persuadir Moisés em aceitar a totalidade da missão que Ele tinha preparado, mas o líder Israelita apresenta muitas objeções, até que a Torá afirma:
"Então se acendeu a ira do Senhor contra Moisés, e disse: Não é Arão, o levita, teu irmão? Eu sei que ele falará muito bem; e eis que ele também sai ao teu encontro; e, vendo-te, se alegrará em seu coração" Êxodo 4:14
Notando a "ira divina" e a introdução de Arão nesta história do Êxodo, o Rabino Shimon bar Yochai, explica que Moisés perdeu uma posição muito mais honrosa do que posteriormente lhe foi dada.
Originalmente, Moisés não estava destinado a ser apenas o מֹשֶׁה רַבֵּנוּ "Moshê Rabbeinu", o "Legislador", professor e líder político de Israel. Ele era para ser também o כהן גדול kohen gadol, o Sumo Sacerdote.
Mas devido à recorrente relutância de Moisés em aceitar fazer o que Deus o pedia, o Senhor retira dele esta honraria e a coloca sobre o seu irmão אַהֲרֹן Arão. E para ilustrar esta honra perdida, o nome de Moisés foi deixado ausente deste trecho da Torá.

O Sucesso do Líder é o Brilho dos Outros

Outra abordagem, não menos intrigante, afirma que a ausência do nome de Moisés nessa parashá (Tetzave), pode ser de natureza muito mais simples do que se imagina, quando tomamos a interpretação oferecida pela פשט peshat (o sentido direto e literal do texto Bíblico).
A parashá Tetzave é a parashá de אַהֲרֹן Aharon, Arão, a parte do Êxodo que inicia o relato da honra do glorioso ministério que Arão e seus descendentes estavam por assumir. Em reconhecimento a este fato, de que este seria o momento de Arão, o tempo de Arão, é que Moisés se retira do texto para permitir que o "brilho" de Arão resplandeça.
Com certeza Moisés está presente, e realizando todos os precedimentos e preparativos para que Arão receba o seu ministério do Sacerdócio, porém é Arão quem está no centro da narrativa, desta vez.
Mesmo Moisés, o maior líder da Bíblia Hebraica, sabe que às vezes é necessário recuar para permitir que outras pessoas possam ser reconhecidas e "brilhar" também!
Nós não temos que ser sempre "os melhores" em tudo! Sabemos que o mundo não gira em torno de nós. Podemos atingir o sucesso, muitas vezes, por permitir que outras pessoas também atinjam seus objetivos.
A felicidade também está em participar da felicidade dos outros, quando estes sentem-se felizes por terem chegado ao sucesso:
"Alegrai-vos com os que se alegram; e chorai com os que choram;" Romanos 12:15

domingo, 22 de março de 2015

A escolha de Arão para o Sumo Sacerdócio


No Êxodo 28, começamos a encontrar diversos textos que anunciam a elevação do status de Arão para o honroso Ministério Sacerdotal, e com ainda mais honra ao ser consagrado como כהן גדול Kohen Gadol, o Sumo Sacerdote.

Moisés é ordenado por Deus realizar vários rituais afim de providenciar a separação do seu irmão Arão, bem como a sua santificação para este ofício eterno, que se estenderia aos seus filhos, à sua descendência.
"Depois tu farás chegar a ti teu irmão Arão, e seus filhos com ele, do meio dos filhos de Israel, para me administrarem o ofício sacerdotal; a saber: Arão, Nadabe, e Abiú, Eleazar e Itamar, os filhos de Arão." Êxodo 28:1
E se observarmos bem este trecho do texto Bíblico, também conhecido em hebraico como parashá Tetzaveh, veremos que falta uma informação crucial para a escolha de Arão e seus descentes para o Ministério do Sacerdócio.
Em que mérito Arão foi selecionado para receber esta honra? O que Arão teria feito para merecer ser proclamado Sumo Sacerdote? Nenhuma explicação é dada. Não há uma justificativa clara no texto.
Em princípio, se levarmos em conta a história de Arão e Moisés, sentimos muito mais que Moisés é quem mereceria esta honra do Sacerdócio, do que Arão. Moisés era uma homem da verdade e da justiça, e buscava a justiça a todo custo.
Moisés não se omitiu quando um dos seus irmãos Israelitas estava sendo castigado ao ponto de morte, por um detrator Egípcio. Antes, Moisés o defendeu e matou o Egípio.
"E aconteceu naqueles dias que, sendo Moisés já homem, saiu a seus irmãos, e atentou para as suas cargas; e viu que um egípcio feria a um hebreu, homem de seus irmãos.

E olhou a um e a outro lado e, vendo que não havia ninguém ali, matou ao egípcio, e escondeu-o na areia." Êxodo 2:11-12
Moisés também não se furtaria ao ver as filhas de Jetro (que depois veio a ser seu genro), sendo maltratadas por pastores em Midiã:
"E o sacerdote de Midiã tinha sete filhas, as quais vieram tirar água, e encheram os bebedouros, para dar de beber ao rebanho de seu pai. Então vieram os pastores, e expulsaram-nas dali; Moisés, porém, levantou-se e defendeu-as, e deu de beber ao rebanho." Êxodo 2:16-17
Moisés era realmente um exemplo de homem justo e fiel, e dele o próprio Deus deu testemunho, "Não é assim com o meu servo Moisés que é fiel em toda a minha casa. Boca a boca falo com ele, claramente e não por enigmas; pois ele vê a semelhança do Senhor" Números 12:7-8
A Consagração de Arão como Sumo Sacerdote.

O Mérito de Arão para o Sacerdócio

Agora se observarmos a vida de Arão, veremos que ele não tinha toda a perfeição que havia em Moisés, o seu irmão mais novo. Arão que nesta mesma passagem citada acima, tinha se atrevido a falar contra Moisés e até mesmo a usurpar o seu lugar na condição de líder de Israel.
Arão que também havia permitido e participado do horrível episódio do pecado coletivo que ficou conhecido como עגל הזהב egel hazahav - o bezerro de ouro, onde os filhos de Jacó fizerem um ídolo dourado, um bezerro, e o adoraram.
Com isso, onde estaria a qualificação de Arão para um Ministério considerado tão Santo e tão Sagrado como o do Sacerdócio Levítico? Por mais que pareça contraditória, a resposta é que a fraqueza que o desqualifica é a mesma que o torna apto para esta elevada missão.
Para entendermos isso, temos que voltar na história do Êxodo, quando Moisés ao descer do monte Sinai após quarenta dias e quarenta noites, encontrou Arão e o povo festejando a adoração ao bezerro de ouro. Moisés indignado, quebra as Tábuas da Lei de Deus.
"E aconteceu que, chegando Moisés ao arraial, e vendo o bezerro e as danças, acendeu-se-lhe o furor, e arremessou as tábuas das suas mãos, e quebrou-as ao pé do monte;" Êxodo 32:19

As Tábuas do Testemunho

O fato é que a Tradição Oral, passada de pai para filho pelos Judeus, ensina que mesmo Moisés tendo feito outras Tábuas sobre as quais Deus voltaria a escrever os Dez Mandamentos, ainda assim, as primeiras, que foram quebradas, não foram descartadas. Elas também teriam sido colocadas na Arca da Aliança.
Esse acontecimento é muito importante para a compreensão da escolha de Arão. Como Sumo Sacerdote, Arão só poderia entrar no lugar chamado Santo dos Santos, apenas uma vez ao ano, no יוֹם כִּפּוּר Yom Kippur, o dia do Perdão, quando deveria oferecer um sacrifício para o perdão dos pecados de si mesmo, e também de todo o povo.
E o que é o Yom Kippur? O Dia do Perdão não é um dia comum. Não é um dia de "justiça", nem da "verdade" como costumamos entender esses atributos. Yom Kippur é um dia de Arrependimento e Perdão.
Neste dia, a verdade e a justiça nua e crua (como a de Moisés), é superada em muito pela misericórdia de Deus. E os fragmentos das primeiras Tábuas da Lei, juntamente com as segundas Tábuas (estas inteiras) formam pares importantíssimos para se compreender a Teshuvá - o Arrependimento.
As primeiras Tábuas da Lei foram quebradas por Moisés em um ato de ira, de consequência contra o pecado. As segundas לוחות luhot (tábuas), foram talhadas por Moisés e depois escritas pelo dedo de Deus - o resultado da interação humana com o Perdão Divino.
Era isso que Arão e seus descendentes viam quando entravam no Santo dos Santos: as Tábuas quebradas - que traziam para Arão uma mensagem única sobre arrependimento; e as Tábuas inteiras.
As Tábuas quebradas são como um coração quebrantado: cada vez que Arão entrava no Santo dos Santos, ele deveria se sentir arrependido pelo pecado da adoração ao bezerro de ouro, que levou à quebra dessas Tábuas.
Como seria diferente se Moisés é que fosse sido o escolhido para ser o Sumo Sacerdote!? Moisés, em sua "perfeição", diria a Deus: "Perdoe o Seu povo, oh Todo Poderoso, pois ELES tem pecado!"
Já com Arão, certamente com a visão das Tábuas quebradas, ele se lembraria de si mesmo e pediria: "Perdoe-nos oh Santo dos Santos, pois EU tenho pecado, pois nós temos pecado!"
Deus escolheu Arão porque ele era o único que teria a habilidade de compreender, de entender a fraqueza e a condição de pecador, que era comum a todos os homens, e de compreender a grandeza do Perdão recebido.
Porque Deus não veio chamar os justos, os perfeitos, os santos, os aperfeiçoados. Ele veio para os "doentes", veio chamar os pecadores ao arrependimento. Essa é a mensagem que a escolha de Arão para o Sacerdócio nos fala:
"Ide, porém, e aprendei o que significa: Misericórdia quero, e não sacrifício. Porque eu nào vim a chamar os justos, mas os pecadores, ao arrependimento.

Dois homens subiram ao templo, para orar; um, fariseu, e o outro, publicano. O fariseu, estando em pé, orava consigo desta maneira: Ó Deus, graças te dou porque não sou como os demais homens, roubadores, injustos e adúlteros; nem ainda como este publicano.

Jejuo duas vezes na semana, e dou os dízimos de tudo quanto possuo.

O publicano, porém, estando em pé, de longe, nem ainda queria levantar os olhos ao céu, mas batia no peito, dizendo: Ó Deus, tem misericórdia de mim, pecador!

Digo-vos que este desceu justificado para sua casa, e não aquele; porque qualquer que a si mesmo se exalta será humilhado, e qualquer que a si mesmo se humilha será exaltado. Lucas 18:10-14

sábado, 21 de março de 2015

As vestes sacerdotais de Arão - Estudo bíblico


Nesta porção (parashá), da Bíblia, abordaremos a בִּגְדֵ֧י כהונה bigdei kehuna, as Vestimentas Sacerdotais.

No Êxodo 28 Arão é separado para exercer o Sacerdócio Levítico. Mas o texto Bíblico continua, e, traz em detalhes como as vestes de Arão deveriam ser confeccionadas, quais materiais Moisés teria que usar para fazer as roupas do Sumo Sacerdote Hebreu.
"E farás vestes sagradas a Arão teu irmão, para glória e ornamento." Êxodo 28:2

"E farão o éfode de ouro, e de azul, e de púrpura, e de carmesim, e de linho fino torcido, de obra esmerada." Êxodo 28:6
Em uma leitura superficial destes versos, não é possível detectar uma mensagem maior, que pudesse justificar tamanhos detalhes que são fornecidos para o modelo das roupas Sacerdotais, a não ser que examinemos as camadas mais profundas destas palavras.

A Lei de Shaatnez

A Tradição Oral, através dos estudos rabínicos, afirma que a "púrpura" e o "carmesim", usados nas vestes de Arão, eram feitos de Lã. Aparentemente, as instruções para se usar a púrpura e o carmesim na confecção dessas vestimentas sagradas, podem ser consideradas contra a Lei de Deus e auto-contraditórias.
Isso porque o "linho" também está presente nas vestes sacerdotais, e há uma ordem divina, expressa para não se usar Lã e Linho na mesma roupa:
"Não te vestirás de diversos estofos [שַֽׁעַטְנֵ֔ז shaatnez] de lã e linho juntamente." Deuteronômio 22:11
Esses mandamentos aparentemente contraditórios levantam diversas questões: Porque Deus proibiria que os Israelitas usassem em suas roupas tecidos feitos de Lã e Linho, conjuntamente?
E porque Ele daria uma ordem contrária, para que as Roupas de Arão contivessem esses dois elementos ora proibidos na Sua própria Lei?
As Vestes do Sumo Sacerdote.

A proibição de usar Lã e Linho combinados na mesma roupa é conhecida como a Lei de שַׁעַטְנֵז Shaatnez, uma palavra presente no livro de דְּבָרִים Devarim - Deuteronômio 22:11.
Essa Lei é de difícil entendimento por fazer parte de um conjunto de regras chamados na Bíblia de חֻקִּים֙ chukim - Estatutos. Os chukim (lê-se ruquim), são Estatutos que tem por característica a não revelação dos motivos de forma explícita ou lógica do que há por detrás do seu enunciado.
São diferentes dos מִּשְׁפָּטִים Mishpatim, Leis em torno dos Dez Mandamentos, que são mais aparentemente Lógicas, que regem relações entre as pessoas - como por exemplo "Não Matarás".
Chukim são Leis que operam no que vai além da nossa compreensão, não são Leis intuitivas. São mandamentos simbólicos, que representam ideias muito maiores do que imaginamos.
E a Lei do Shaatnez - para não usar Lã e Linho ao mesmo tempo - é um grande exemplo. A Lã vem do reino animal, enquanto que o Linho vem de uma planta herbácea, do reino vegetal, ou seja, da terra (assim como o algodão e o sisal).
E a Midrash (histórias simbólicas), por meio da Tradição Oral, explica que esses dois elementos têxteis representam dois indivíduos, dois domínios, dois reinos:
"E deu à luz mais a seu irmão Abel; e Abel foi pastor de ovelhas, e Caim foi lavrador da terra." Gênesis 4:2
Caim era agricultor, e Abel um pastor. Eles tentaram servir a Deus por meio de ofertas, sacrifícios que trouxeram perante o Senhor. Era a primeira vez que alguém traria um oferta, como meio de chegar mais próximo de Deus.
De certa forma, a oferta deles é algo que foi transmitido através do tempo, e que faz lembrar do sistema sacrificial do Sacerdócio Levítico.
"E aconteceu ao cabo de dias que Caim trouxe do fruto da terra uma oferta ao Senhor.

E Abel também trouxe dos primogênitos das suas ovelhas, e da sua gordura; e atentou o Senhor para Abel e para a sua oferta. Mas para Caim e para a sua oferta não atentou. E irou-se Caim fortemente, e descaiu-lhe o semblante." Gênesis 4:3-5
Muito embora os dois irmãos esperassem servir a Deus, a inveja entrou entre eles de forma tal que Abel acabou sendo vítima da ira descontrolada de seu irmão. A Midrash explica que como resultado desse assassinato, uma nova Lei foi introduzida no mundo.
Uma Lei que preserva e separa os domínios, os mundos de Caim e Abel, que neste sentido são representados pela Lã e pelo Linho. Lã de animal - Abel. Linho vegetal - Caim.
Com o pecado veio a expulsão do homem do Éden - o jardim de Deus - o que levou à imperfeição do ser humano e a separação de seus irmãos. Hoje o homem tem dificuldade em amar ao seu próximo - que é seu irmão - todos descendem de Adão e Eva.
A proibição da Lã e do Linho fala de não estarmos em posição de despertar nenhum tipo de sentimento que leve à mágoa, o rancor, à ofensa e nem do assassinato do próximo.
"Eu, porém, vos digo que qualquer que, sem motivo, se encolerizar contra seu irmão, será réu de juízo; e qualquer que disser a seu irmão: Raca, será réu do sinédrio; e qualquer que lhe disser: Louco, será réu do fogo do inferno." Mateus 5:22
Mas temos que vigiar, sabendo que essas duas naturezas foram separadas, temos que compreender os pontos fracos dos nossos irmãos. Lã e Linho, Caim e Abel falam das diferenças que podem vir a existir entre os homens.
Não raramente temos diferenças com os diferentes - aqueles que não são como nós somos, que não tem a mesma filosofia de vida, que enxergam o mundo de forma não igual à nossa.
O desconhecido sempre tem a capacidade de despertar Medo e Eles, os diferentes, logo passam a ser vistos como ameaçadores - o que geralmente causa divisão e separação entre as pessoas.

Lã e Linho nas Vestes Sacerdotais

Porém, o Sumo sacerdote Arão recebe ordem de Deus para usar Lã e Linho em suas vestimentas - porque a reconciliação vem de Deus.
O Sacerdote usa as suas vestes contendo esses dois elementos como símbolo de reconciliação, do resgate total do senso de irmandade entre os homens, de que um dia com a regeneração do homem, finalmente "Caim" e "Abel" possam estar lado a lado, servindo a Deus em verdade e humildade, sem inveja, sem a violência que é tão comum às religiões pelo mundo afora.
As roupas de Arão, contendo Lã e Linho, falam de uma profunda união que supera as diferenças, da volta ao estado original, em santidade, que foi reconquistada no sacrifício eterno da cruz. Pois o sacerdote fazia a expiação dos pecados por meio do sangue.
E por causa do sangue da expiação, era permitido ao sacerdote unir esses dois reinos, e se vestir com roupas que simbolizavam a união da humanidade como irmãos. O sangue pagava o preço da reunificação de Caim e Abel.
E o sangue de Jesus, pagou todo o preço para que nós pudéssemos ser novamente reunidos em um só corpo, em irmandade, em amor, no corpo de Cristo, Nele tudo está pago, tudo está consumado. O preço da união dos irmãos foi pago de uma vez para todo o sempre.
Caim e Abel são diferentes - um é agricultor, o outro é pastor de ovelhas. Nós também temos nossas diferenças.
Mas no sangue de Jesus, "Caim e Abel" não são mais inimigos, voltam a ser irmãos. Por mais diferenças que tenhamos uns para com os outros, em Jesus nós somos outra vez irmãos.
Jesus como nosso Sumo Sacerdote, carregava em Suas roupas a Lã e o Linho, unindo novamente todos os filhos de Deus, que andavam dispersos pelo mundo.
"E, quando Jesus tomou o vinagre, disse: Está consumado. E, inclinando a cabeça, entregou o espírito." João 19:30